O Brasil e a Proteção da Camada de Ozônio: uma parceria bem-sucedida entre governo, setor produtivo e sociedade.

“Brasil contribui significativamente para comitês técnicos do Protocolo de Montreal”, afirma especialista

Entrevista: Roberto Peixoto

Roberto Peixoto

Doutor em Engenharia Mecânica pela Universidade de São Paulo (USP), Roberto Peixoto é atualmente Professor Pleno do Instituto Mauá de Tecnologia e co-coordenador do Comitê de Opções Técnicas para Refrigeração, Ar Condicionado e Bombas de calor (RTOC) do Protocolo de Montreal.

Especialista na área de refrigeração e ar-condicionado, ele é um dos responsáveis pela elaboração de informações técnicas para subsidiar as decisões tomadas pelos países partes do Protocolo de Montreal.

Em entrevista exclusiva aos parceiros para a implementação do Protocolo de Montreal no Brasil, Peixoto comentou sobre as responsabilidades do comitê técnico, a participação brasileira no cenário internacional para as pesquisas relacionadas ao setor de refrigeração, e o sucesso dos 30 anos de implementação do Protocolo para a proteção da camada de ozônio

O que é o Painel de Avaliação Técnica e Econômica (TEAP) do Protocolo de Montreal e qual o seu papel nas forças tarefas de auxílio às decisões das Partes do Protocolo de Montreal?

O Painel de Avaliação Técnica e Econômica, com a sigla TEAP em inglês, é um painel constituído por especialistas das áreas que são afetadas pelas decisões do Protocolo de Montreal. Fazem parte desse painel os coordenadores dos comitês de opções técnicas de refrigeração e ar-condicionado, solventes, brometo de metila, espumas, agentes de extinção de incêndio.

O painel atua como um braço para a implementação do Protocolo de Montreal, com a função básica de desenvolver estudos técnicos e econômicos para os tomadores de decisão, que são os países partes do Protocolo de Montreal.
Nesse painel, sou co-coordenador do Comitê de Refrigeração, Ar-Condicionado e Bombas de calor - RTOC. Existem dois coordenadores, um representando os países em desenvolvimento, que sou eu, e um coordenador representando países desenvolvidos, que é professor de uma universidade italiana. Participamos anualmente de uma reunião desse painel, para as discussões de tarefas, dos estudos demandados pelos países signatários e também para uma avaliação do trabalho que vem sendo realizado em cada um dos comitês técnicos.

O que é o Comitê de Opções Técnicas para Refrigeração, Ar Condicionado e Bombas de calor (RTOC)? Quais são as principais discussões abordadas pelo RTOC e que compõem os relatórios por ele publicados? Qual sua relevância para o Brasil?

Uma experiência pioneira que marcou o Protocolo de Montreal, e serve de referência para outros protocolos mundiais ambientais, é que ele foi fundado com base em uma avaliação técnica, econômica e científica das ações e das medidas que deveriam ser implementadas. No início, foram verificadas quais as áreas técnicas que seriam afetadas pelas medidas de eliminação e de substituição de substâncias destruidoras da camada de ozônio e, para cada uma dessas áreas, foi criado um comitê técnico, com o objetivo de analisar alternativas e aspectos importantes que demandariam ações complementares com relação a transferência de tecnologia e de treinamentos.
No caso específico de refrigeração, ar-condicionado e bombas de calor, esse é o maior comitê (RTOC). A área é a mais importante do Protocolo de Montreal, por conta do uso intenso da substância destruidora da camada de ozônio e suas alternativas, e o comitê é constituído por aproximadamente 40 técnicos e especialistas de três categorias: representantes de indústrias, que instalam e fabricam equipamentos de refrigeração, ar-condicionado e bomba de calor; representantes da academia, de institutos de pesquisa, de universidades, como é o meu caso; e engenheiros, consultores envolvidos na avaliação técnica, na assessoria, no projeto de instalações nessa área. 

Desenvolvemos, a cada quatro anos, o Relatório de Opções Técnicas, dividido em vários capítulos, que são as grandes áreas de ar-condicionado, refrigeração e bombas de calor e envolve diversas aplicações. Cada uma delas tem um uso particular de um fluido refrigerante, que é a substância que está em foco com as medidas do Protocolo de Montreal. Por exemplo, a atual classificação que usamos no relatório varia de refrigeração doméstica, refrigeração comercial, refrigeração industrial, transporte refrigerado, bombas de calor – para aquecimento ambiental e de água -, ar-condicionado automotivo, todas as aplicações da grande área de refrigeração e ar-condicionado, e cada uma dessas áreas tem um coordenador do capítulo, que desenvolve um texto sobre o estado atual de uso de substâncias destruidoras da camada de ozônio e também das alternativas existentes, fazendo uma avaliação de prós e contras de cada uma das alternativas. Isso é encaminhado para as Partes do Protocolo de Montreal.

Além desse documento ser um relatório bastante robusto do ponto de vista técnico e tecnológico, ele é um relatório muito importante para a comunidade técnico-científica da área de refrigeração e ar-condicionado, porque é um documento que contém um sumário, uma síntese de todas as opções. Então, é muito utilizado nas instituições de ensino, por engenheiros e técnicos da área, e é muito citado na produção técnica, na literatura que é produzida nessa área.

Quais países integram e/ou colaboram com os relatórios desenvolvidos pelo RTOC? O Brasil e a América Latina têm grande representatividade?

O comitê de refrigeração e ar-condicionado, assim como os demais, deveriam, no princípio, obedecer alguns critérios na sua formação. Um deles é um balanço geográfico. Então, teríamos que ter uma abrangência geográfica global, com representantes de vários países. No caso do Comitê de Refrigeração, Ar-condicionado e Bombas de Calor, temos representantes de vários países europeus – Holanda, Inglaterra, Itália, Dinamarca - , dos Estados Unidos, Japão, China, os países do Golfo – Emirados Árabes, Arábia Saudita -, enfim, há diversos representantes. Da América Latina, temos um representante do Peru e um representante brasileiro – que sou eu. Historicamente, temos nos restringido, na América Latina, a essa representação. Nesse comitê, não há a participação de outros países da América Latina, mas, constantemente, a cada quatro anos, quando finalizamos o Relatório, fazemos uma avaliação da composição, considerando essa questão da abrangência e também tentando atender à solicitação dos países que nomeiam seus técnicos.

Além da questão do balanço geográfico mundial, também como uma diretriz das Nações Unidas, deveríamos ter um balanço de gênero, com uma participação significativa tanto de homens quanto de mulheres. Infelizmente, no caso do Comitê de Refrigeração, Ar-condicionado e Bombas de Calor, a gente não tem ainda uma participação feminina significativa, mas isso é um objetivo dessas avaliações que temos feito, reconsiderando essa questão do balanço de gênero.

Como o seu trabalho e pesquisa no Brasil se conciliam com os objetivos do Protocolo de Montreal e com sua atuação no TEAP?

Eu atuo na área de ciências térmicas, com foco específico em refrigeração, ar-condicionado e bombas de calor. Tem uma atividade aqui no Instituto Mauá de Tecnologia de ensino nessa área. Na atividade didática, eu uso toda essa experiência e as informações que são obtidas nesses estudos que são feitos no Comitê de Refrigeração, Ar-condicionado e Bombas de Calor, e também no TEAP. Tenho desenvolvido algumas atividades de pesquisa relacionadas com o uso de fluidos refrigerantes alternativos, que estão diretamente ligadas às atividades do comitê, e também de avaliação de emissões de fluidos refrigerantes.

Como o senhor avalia o desempenho do Brasil no desenvolvimento de pesquisas científicas e de tecnologias na área de refrigeração e ar-condicionado que sejam benéficas à camada de ozônio e ao clima?

O Brasil, como um país tropical, de grande dimensão, e com necessidades de refrigeração e ar-condicionado, tem que acompanhar o que está acontecendo tecnologicamente no mundo, fruto das decisões do Protocolo de Montreal. A gente tem uma capacidade nacional de engenharia, de tecnologia, de manufatura de equipamentos dessa área, e as empresas que fabricam equipamentos têm um processo de segmento das opções tecnológicas, desenvolvendo testes, avaliando seus produtos. Além disso, eu acho que, em certas áreas, o Brasil tem um papel protagonista, como na área de compressores herméticos. Nós temos uma empresa líder mundial, a Embraco, que tem um papel muito importante no desenvolvimento de produtos, de compressores, para as várias alternativas de fluidos refrigerantes. Então, eu posso dizer que, em algumas áreas, o Brasil tem um papel destacado na avaliação e desenvolvimento de produtos para contribuir com a eliminação das substâncias destruidoras da camada de ozônio.

Além disso, o Brasil tem também um papel importante na América Latina de difusor de informações e de tecnologia através dos seus congressos e encontros técnicos, das feiras que são bastante frequentadas por todos os países da América Latina.

Quais os principais desafios que o senhor identifica para a área de refrigeração e ar-condicionado de forma a cumprir as metas do Protocolo de Montreal para os próximos anos?

O Protocolo de Montreal, após a eliminação dos CFCs, estabeleceu o processo para atual eliminação dos HCFCs. No caso da refrigeração, é o chamado R-22, o principal fluido utilizado em instalações e ar-condicionado. Os países desenvolvidos já eliminaram esse fluido e têm medidas específicas com relação ao seu uso em instalações existentes, e os países em desenvolvimento estão nesse processo de eliminação. Este é o desafio: eliminar esse fluido, considerando que as alternativas, ao contrário da eliminação dos CFCs, não são tão simples e diretas. No processo de eliminação dos CFCs, havia uma convergência para algumas alternativas, e elas, de certa forma, satisfaziam as várias aplicações. No caso dos HCFCs, existe um leque maior de alternativas, com características particulares e com propriedades particulares. Um dos aspectos, nessa discussão, são as propriedades dos fluidos com relação à flamabilidade e a questão também da eficiência energética que ele vai proporcionar no equipamento onde será utilizado.

Além disso, o Protocolo de Montreal possui uma importante convergência como instrumento de auxílio de processo de combate ao aquecimento global e à mudança do clima, e aprovou ano passado uma redução gradual dos HFCs, os hidrofluorcarbonos, que foram uma alterativa aos CFCs e são uma alternativa aos HCFCs. Então, este é um outro desafio: como fazer a eliminação dos HCFCs não contando com esses HFCs, que têm um alto potencial de aquecimento global. Eu diria que são desafios motivadores e a comunidade técnico-científica terá que avaliar todas essas questões.

Como avalia os 30 anos do Protocolo de Montreal e a contribuição do Brasil ao longo dessas décadas para a proteção da camada de ozônio?

O Protocolo de Montreal é um caso de sucesso. No Protocolo, além desse painel de avaliação econômica e técnica, tem um painel também de avaliação científica que monitora e avalia a situação da camada de ozônio. Então, as medidas tomadas pelos países para eliminação das substâncias destruidoras da camada de ozônio foram fundamentais para a não continuidade do crescimento da destruição da camada de ozônio, ou seja, foram fundamentais para interromper esse processo e, em um futuro próximo, permitir à camada voltar a ter a configuração que tinha antes da sua destruição.

O Protocolo teve e tem um papel fundamental nas tomadas de decisão ao munir os países com informações técnicas e científicas. Isso é um marco também que foi e está sendo seguido por outros acordos internacionais. O Protocolo criou mecanismos de apoio para os países em desenvolvimento, apoio financeiro, apoio de transferência de tecnologia, apoio de treinamento e capacitação, que foi muito importante. É um exemplo muito saudável de multilateralismo, com decisões para garantir a sustentabilidade planetária que muitas vezes são difíceis. Existem grandes discussões, interesses de vários grupos, de várias partes, e é possível a gente conciliar todos esses interesses e ter decisões importantes para preservação da vida no planeta.

O Brasil teve uma importância grande, desde o começo. Contribuiu com especialistas em diversos comitês técnicos para análise das alternativas. Além da minha participação, o Brasil tem diversos outros participantes nos comitês técnicos, que são participantes voluntários. Então, o Brasil tem contribuído significativamente nesses comitês técnicos, sendo um foco que erradia vários estudos e várias avaliações para a região da América Latina.

Além disso, sob o ponto de vista diplomático e político, a participação do Brasil nas discussões que eu acompanho como especialista é reconhecida por toda comunidade internacional, principalmente a participação do Brasil na discussão e avaliação de medidas que o Protocolo de Montreal, ao longo desses 30 anos, tomou. Inicialmente, o Protocolo estabeleceu um conjunto de medidas e depois elas foram sendo revisadas ao longo do tempo. O Brasil teve e tem um papel muito importante nessa revisão, ressaltando inclusive o último movimento do Protocolo, que foi a aprovação da medida de redução dos HFCs em Kigali ano passado. O Brasil teve uma participação muito importante na discussão para chegar a um acordo em meio a vários interesses conflitantes.

 

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